terça-feira, 26 de setembro de 2023

Não ao abate de aves nativas nos Açores


Não ao abate de aves nativas nos Açores

Perante os recentes planos do Governo Regional dos Açores de autorizar o abate de aves protegidas, como o pombo-torcaz-dos-Açores (Columba palumbus azorica) e o melro-preto-dos-Açores (Turdus merula azorensis), supostamente por causarem prejuízos à agricultura ou devido a um excesso de população [1], afirmações feitas sem nenhuma base científica ou técnica, queremos denunciar as recorrentes falsidades com as quais se pretende justificar este novo e grave atentado contra a fauna e a natureza das nossas ilhas.

É falso que exista um excesso de população destas aves nativas. Na realidade, todas as espécies nativas têm os seus próprios mecanismos de regulação natural, não fazendo qualquer sentido, na ausência de desequilíbrios induzidos, pensar em excessos de população, e ainda menos num meio de tão reduzidas dimensões como o nosso arquipélago. O conceito de excesso de população só é aplicável, regra geral, às espécies exóticas invasoras, introduzidas pelo homem no arquipélago e, portanto, sem nenhum tipo de regulação natural, como é o caso do coelho-bravo e dos ratos, espécies efectivamente causantes de importantes danos na agricultura.

Pelos mesmos motivos, é uma falsidade dizer, em rigor, que uma ave nativa pode ser considerada uma praga. Não existe, de facto, nenhuma ave nativa nos Açores que possa multiplicar-se de forma rápida e sem controlo criando subitamente uma superpopulação causadora de danos.

Pelo contrário, a situação das espécies nativas é muito preocupante em termos de conservação. O pombo-torcaz-dos-Açores é uma espécie incluída no Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal [2] e a legislação europeia confere-lhe a máxima protecção, proibindo expressamente o seu abate (Directiva Aves, Anexo I), proibição que é igualmente aplicável durante o período reprodutor a qualquer outra espécie protegida.

A população do pombo-torcaz-dos-Açores apresenta-se, na realidade, muito reduzida como consequência da progressiva perda do seu habitat natural, constituído pela floresta laurissilva, quase desaparecida na actualidade, e por causa da caça ilegal [2]. A densidade de população da espécie nos Açores é muito mais baixa do que é habitual para a mesma espécie no continente, contabilizando-se apenas 5 aves/km2 em época pós-reprodutora na maioria das ilhas [3]. Deve considerar-se também que durante a época reprodutora, que vai de fevereiro a setembro, a espécie tem ainda um comportamento territorial [4].

As características da reprodução desta espécie fazem com que uma eventual recuperação das suas populações seja muito difícil, pois de forma geral só têm uma cria por ano. Pior ainda, segundo um recente estudo realizado na Terceira [4], a ilha aparentemente com maior abundância da espécie, o seu sucesso reprodutor é de apenas 9%, chegando a juvenis só uma décima parte do número inicial de ovos. E mais de metade dos indivíduos juvenis poderia não sobreviver ao primeiro ano de vida [3]. Nestas condições, portanto, é irrealista falar de excesso de população ou de que a espécie possa multiplicar-se fora de controlo, sendo certo que o abate de exemplares poderia colocar em grave risco a sobrevivência da mesma.

A verdade é que a desaparição desta espécie é uma possibilidade bem real, como indica o triste exemplo do arquipélago da Madeira: o pombo-torcaz-da-Madeira (Columba palumbus maderensis) foi completamente exterminado em tempos recentes, encontrando-se a espécie actualmente extinta [2]. E a outra espécie de pombo nativo deste arquipélago, o pombo-trocaz (Columba trocaz), continuamente acusado também de causar prejuízos à agricultura, já desapareceu da ilha de Porto Santo, sobrevivendo actualmente apenas na ilha da Madeira.

De facto, pensa-se que há poucas décadas o próprio pombo-torcaz-dos-Açores poderia ter estado próximo da extinção, reduzido talvez a só duas centenas de casais reprodutores, e unicamente foi salvo pela proibição da sua caça na década de 1990 [3]. Curiosamente, mesmo nesses momentos a espécie continuava a ser acusada de causar danos e de estar em excesso. Os estudos existentes revelam, neste sentido, uma incongruência entre as queixas dos agricultores e o comportamento observado nas aves, responsáveis por apenas estragos pontuais e localizados [5].

Na realidade, existe frequentemente uma incorrecta percepção das espécies que são responsáveis pelos danos nas culturas. Apesar de que os viticultores dos Açores têm assinalado muitas vezes estas espécies como pragas, sendo por vezes eliminadas por isso, um recente estudo realizado na ilha Terceira [6] demonstra que o pombo-torcaz-dos-Açores e o melro-preto-dos-Açores provocam danos pouco significativos neste tipo de culturas. Pelo contrário, as principais responsáveis pelas perdas são duas espécies exóticas invasoras: a lagartixa-da-Madeira (Teira dugesii) e o pardal-doméstico (Passer domesticus), para além das várias espécies de ratos, todas elas igualmente invasoras. Resultados semelhantes foram obtidos na ilha do Pico [7].

Outra das aves acusada de ser uma praga, o melro-preto-dos-Açores, é na realidade uma espécie de comportamento territorial, não existindo portanto possibilidade de haver altas densidades de exemplares nem excessos de população. Para além disso, a sua alimentação é omnívora, consumindo ao longo do ano insectos, lagartas, minhocas ou caracóis, pelo que resulta de facto incompreensível esquecer agora o seu possível papel benéfico para a agricultura, próprio deste tipo de aves [6].

Numa situação diferente em relação às anteriores encontra-se a rola-turca (Streptopelia decaocto), uma espécie que tem vindo a colonizar o continente europeu durante o século passado e chegou aos Açores há apenas uns quinze anos, tendo-se reproduzido e expandido desde então pelo arquipélago. Devido à sua recente chegada, pouco é sabido sobre o seu comportamento e a sua possível tendência populacional, ainda que o mais provável é que venha ocupar um habitat semelhante ao do pombo-das-rochas. Refira-se, já agora, o desconhecimento que existe também sobre esta última espécie, considerada cinegética, pois a forma própria das ilhas, o pombo-das-rochas-atlântico (Columba livia atlantis), poderia ter desaparecido devido à introdução e hibridação com as numerosas variedades domésticas da forma continental da espécie.

Apesar de tudo o referido, o Governo Regional decidiu avançar agora, de forma despropositada, com a autorização do abate da rola-turca [8] sem se conhecer a dinâmica da sua população nem quantificar os danos que esta nova espécie nativa possa produzir. A recente autorização contradiz claramente a legislação vigente, pois não são apresentados os imprescindíveis estudos sobre a situação da espécie, não se dá prioridade a métodos de controlo não violentos, não se colocam limites ao abate e não se evita o período reprodutor da espécie. Para além disso, o Governo insiste na falsidade dos danos desta espécie nas culturas vitivinícolas, estigmatizando e relacionando este sector com práticas ambientalmente reprováveis. E longe de tentar clarificar todas estas questões, o Governo Regional ainda evitou propositadamente o debate deste tema na Assembleia Regional [9].

Não há dúvidas de que em toda sociedade moderna qualquer actividade económica, onde a agricultura se insere, deve respeitar limites e regras, não sendo aceitável que essa actividade atente contra as pessoas, a natureza ou o ambiente. Uma agricultura que se quer sustentável e com futuro deve adoptar necessariamente um modelo de actividade integrado e em harmonia com a natureza, mostrando um respeito crescente pelos ecossistemas naturais nos quais se insere.

Surpreende que, ainda hoje, a natureza possa ser considerada como o inimigo e a única solução para qualquer problema seja matar e eliminar as espécies existentes, uma situação própria de tempos passados, quando por exemplo o priolo (Pyrrhula murina), uma ave endémica da ilha de São Miguel, foi considerada nociva e quase exterminada pelos danos que supostamente causava nas culturas de laranja [10]. Mais surpreendente é que o Governo Regional alinhe nesta visão retrógrada e, longe de proteger a fauna nativa e a agricultura, dedique o seu tempo a insistir em falsidades em vez de procurar soluções reais. Existem, de facto, muitas e variadas formas de minimizar os possíveis danos produzidos pelas aves na agricultura: protecções com redes, dispositivos afugentadores de diferentes tipos, plantação simultânea de culturas alternativas, para além das compensações económicas pela eventual perda de rendimentos.

Não é esta, infelizmente, a primeira tentativa de introduzir na região o abate de espécies de aves protegidas. Já em 2015 pretendeu-se autorizar o abate das duas primeiras espécies citadas e do estorninho-dos-Açores (Sturnus vulgaris granti). Finalmente, perante a falta real de argumentos e perante a oposição da opinião pública, o abate foi substituído por medidas reais para minimizar os danos causados na agricultura, preservando-se também, desta forma, a classificação da Paisagem da Cultura da Vinha da Ilha do Pico. Naquele momento, o protesto incluiu uma petição pública [11] que recolheu quase um milhar de assinaturas, contando também com o apoio de diversas organizações ambientalistas regionais e nacionais.

As aves nativas dos Açores, resultado de milhões de anos de evolução, são únicas no mundo, possuem um elevado valor natural e desempenham um papel fundamental na manutenção dos frágeis e ameaçados ecossistemas insulares. É necessário, portanto, adaptar a prática de uma agricultura sustentável à imprescindível protecção das nossas espécies e da natureza das nossas ilhas.

Referências:

[1] Açores vão controlar excesso de aves protegidas que são praga para agricultura. Lusa, 14/08/2023. Acedido em: https://www.sapo.pt/noticias/economia/acores-vao-controlar-excesso-de-aves_64da64e96714d631b617b6ab

[2] Almeida, J., Catry, P., Encarnação, V., Franco, C., Granadeiro, J.P., Lopes, R., Moreira, F., Oliveira, P., Onofre, N., Pacheco, C., Pinto, M., Pitta Groz, M.J., Ramos, J. & Silva, L. 2005. Columba palumbus Pombo-torcaz. Em: M.J. Cabral et al. (eds), Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal, p. 329. Instituto da Conservação da Natureza, Lisboa.

[3] Dickens, M. & Neves, V. 2005. Post-breeding density and habitat preferences of the Azores Woodpigeon, Columba palumbus azorica: an inter-island comparison. Arquipélago. Life and Marine Sciences 22A: 61-69.

[4] Fontaine, R., Neves, V.C., Rodrigues, T.M., Fonseca, A. & Gonçalves, D. 2019. The breeding biology of the endemic Azores Woodpigeon Columba palumbus azorica. Ardea 107: 47–60. doi:10.5253/arde.v107i1.a4

[5] Plano Sectorial para a Rede Natura 2000 – Açores. Espécies da Directiva Aves/Habitats 140/99 Diário da República Anexo A-1: Columba palumbus azorica. IslandLAB. https://islandlab.uac.pt/fotos/publicacoes/publicacoes_Columba_palumbus_azorica_EspeciesDirectivaAvesHabitats140_99_DiarioRepublicaAnexoA-I.pdf

[6] Lamelas-López, L. & Ferrante, M. 2021. Using camera-trapping to assess grape consumption by vertebrate pests in a World Heritage vineyard region. Journal of Pest Science 94:585–590. https://doi.org/10.1007/s10340-020-01267-x

[7] Genética revela que pombo-torcaz é mesmo único nos Açores. Diário Insular, 09/06/2022.

[8] Despacho n.º 1556/2023 de 8 de setembro de 2023. Jornal Oficial II Série - Número 174, 8 de setembro de 2023. https://jo.azores.gov.pt/#/ato/0f622003-4b8b-432c-848f-9cfb8820beec

[9] Partidos de direita ignoram estudo e permitem abate indiscriminado de ave protegida provocando danos na biodiversidade e reputacionais. Nota de imprensa do Grupo Parlamentar do BE. http://base.alra.pt:82/Doc_Noticias/NI18508.pdf

[10] Tavares, J. (coord). 2015. Parecer do Departamento de Biologia sobre o “Projecto de Resolução Nº96-X – Plano estratégico de combate às pragas dos Açores”. Universidade dos Açores. http://base.alra.pt:82/iniciativas/p_social/ps1588.pdf

[11] Petição Pública: Em Defesa da Avifauna Açoriana. Pela conciliação da protecção das espécies com uma exploração agrícola sustentável. http://peticaopublica.com/pview.aspx?pi=DefesaAvifaunaAcores

ASSOCIAÇÕES E GRUPOS ASSINANTES:

Amigos dos Açores – Associação Ecológica

Amigos do Calhau – Associação Ecológica

IRIS – Associação Nacional de Ambiente, Núcleo Regional dos Açores

Avifauna dos Açores

Coletivo Açoriano de Ecologia Social

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2023

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2023

quarta-feira, 21 de dezembro de 2022

Onde residiu Alice Moderno em Ponta Delgada?

Onde residiu Alice Moderno em Ponta Delgada?

Desconhecemos onde morou Alice Moderno quando vivia com os pais em Ponta Delgada. Sabe-se que, em 1883, o pai possuía o consultório na Rua do Colégio, nº 65 (atual rua Carvalho Araújo). Não sabemos se o consultório se localizava no mesmo edifício da moradia.

Foto1- Rua do Colégio, 65 (porta da direita)
Em 1887, quando a família foi viver para a Achada do Nordeste, Alice Moderno fica, em Ponta Delgada, em casa da Dona Rosa Emília de Sequeira Morais, localizada na Rua dos Mercadores, nº 21, 2º andar.

Foto 2- Rua dos Mercadores, nº 19 (o nº 21 não existe atualmente, a porta a meio tem o número 19)

Em princípios de 1893, Alice Moderno já se encontrava a viver no número 69 da Rua dos Mercadores, em casa da senhora Maria Augusta de Morais.

Foto 3- Rua dos Mercadores, 69 (porta à direita)

Ainda no ano de 1893, Alice Moderno começa a viver em casa de D. Maria Emília Borges de Medeiros, na Rua da Fonte Velha, nº 36 (atual Rua Manuel da Ponte). Viveu nesta casa, cujo usufruto vitalício lhe fora legado por aquela senhora, até ao fim da sua vida em 1946.

Foto 4- Rua Manuel da Ponte, 36 (porta ao centro debaixo da placa)

Todas as imagens estarão corretas se não foram, ao longo do tempo, alterados os números de polícia.

Fonte: Vilhena. M. (1987). Alice Moderno: A mulher e a obra. Angra do Heroísmo. Direção Regional dos Assuntos Culturais-Secretaria Regional de Educação e Cultura

Pico da Pedra, 21 de dezembro de 2022

Teófilo Braga

domingo, 4 de dezembro de 2022

Alice Moderno e o Hino das Sociedades Protetoras dos Animais

Alice Moderno e o Hino das Sociedades Protetoras dos Animais

No dia 11 de abril de 1915, Alice Moderno publicou, no seu jornal “A Folha”, o Hino das Sociedades Protetoras dos Animais.

A letra é do jornalista Alberto Bessa (1861-1930) e a música da autoria de Thomaz de Lima (1887-1950). Alberto Bessa foi escritor e jornalista e António Thomaz de Lima foi violinista, compositor, maestro e professor no Conservatório Nacional de Lisboa, tendo residido em São Miguel, onde nasceu o seu filho Eurico Thomaz de Lima, na cidade de Ponta Delgada, em 1908.

Embora, hoje, o entendimento que se tem do “papel” dos animais no mundo seja bastante diferente do que havia no início do século XX, a letra do hino é clara ao afirmar que devemos amar e proteger todos os seres vivos, como se pode concluir através da leitura dos dois últimos versos:

“Sejamos todos bons para tudo o que é vivente:

- Árvore ou animal, insetos ou passarinho.”

Hino das Associações Protetoras dos Animais

Se o homem foi fadado o rei da criação,

E à frente dos mais seres a natureza o pôs,

É seu dever prestar aos outros proteção,

Sem ter jamais direito a ser o seu algoz.

Um povo civilizado

Só é o que souber

A tudo o que é criado

Amar e proteger

No mundo os animais são nossos companheiros,

E embora a natureza os fizesse inferiores,

É certo que lhes deu afetos verdadeiros,

Tornando muitos deles em nossos servidores.

Um povo civilizado

Só é o que souber

A tudo o que é criado

Amar e proteger

Devemos todos, pois, tratá-los com piedade,

Que há uma só justiça, com uma só razão,

Ambas a condenar toda a barbaridade,

Ambas a reclamar para eles compaixão.

Ser bom é uma virtude augusta e resplandecente,

Da qual cumpre seguir o largo e bom caminho,

Sejamos todos bons para tudo o que é vivente:

-Árvores ou animal, inseto ou passarinho.

Pico da Pedra, 4 de dezembro de 2022

Teófilo Braga

sábado, 12 de novembro de 2022

Colocada nova Placa no Hospital Veterinário Alice Moderno

Este mês foi colocada nova placa no antigo Hospital Veterinário Alice Moderno.

terça-feira, 11 de outubro de 2022

Alice Moderno e Maria Evelina de Sousa- Cronologia da sua intervenção em defesa dos Animais

Alice Moderno e Maria Evelina de Sousa- Cronologia da sua intervenção em defesa dos Animais
“Caridade não é apenas a que se exerce de homem para homem: é a que abrange todos os seres da Criação, visto que a sua qualidade de inferiores não lhes tira o direito aos mesmos sentimentos de piedade e de justiça que prodigalizamos aos nossos semelhantes” (Alice Moderno)

26 de novembro de 1908- por iniciativa de Alice Moderno realizou-se uma reunião que também contou com a participação de representantes do Diário dos Açores e de Maria Evelina de Sousa, da Revista Pedagógica. Foi decidido elaborar os estatutos da futura Sociedade Micaelense Protetora dos Animais.

15 de agosto de 1910- João Anglin, no jornal “Vida Nova” publicou um texto a apelar à criação de uma associação de proteção dos animais. Alice Moderno transcreveu o texto no seu jornal “A Folha”.

6 de outubro de 1910- Maria Evelina de Sousa na Revista Pedagógica anuncia que já havia encetado alguns trabalhos, mas havia suspendido por falta de coadjuvação da parte dos restantes membros da comissão que iria criar a associação.

27 de abril de 1911- Maria Evelina de Sousa anuncia a criação em breve da SMPA, cujos estatutos foram redigidos por ela, tendo como modelo os da Sociedade Protectora dos Animais de Lisboa. “O Sr. Henrique Xavier de Sousa, que é um calígrafo muito hábil” ficou incumbido “de os copiar em conformidade com a lei”.

13 de setembro de 1911- Foi legalizada a SMPA. Foram seus fundadores: Caetano Moniz de Vasconcelos (governador civil), Alfredo da Câmara (diretor de O Repórter), Amâncio Rocha, Augusto da Silva Moreira, Fernando de Alcântara, Francisco Soares Silva (director do jornal anarquista Vida Nova), José Inácio de Sousa, Joviano Lopes, Manuel Botelho de Sousa, Manuel Resende Carreiro, Marquês de Jácome Correia, Miguel de Sousa Alvim, Alice Moderno e Maria Evelina de Sousa.

14 de novembro de 1912 - a Revista Pedagógica publicou um texto onde o seu autor dá a conhecer que a SMPA já estava a cobrar as quotas dos seus associados e que a sede da mesma continuava a ser nas instalações dos Bombeiros Voluntários de Ponta Delgada até à sua passagem para a rua da Fonte Velha (casa de Alice Moderno?).

28 de novembro de 1912- Em reunião da SMPA foi decidido oficiar à Câmara Municipal de Ponta Delgada “a regulamentação das carroças puxadas por carneiros” e “oficiar à corporação competente para que seja modificada a rampa no início da rua dos Mercadores, rampa que é um verdadeiro tormento para os pobres animais”.

29 de junho de 1913- noticia que, após diligências efetuadas pela SMPA, a Câmara Municipal de Ponta Delgada decidiu criar “uma nova postura proibindo que carneiros e animais congéneres sejam considerados como de tiro”.

1914- Alice Moderno é eleita presidente e sob a sua presidência a vida da SMPA alterou-se por completo, tanto no que diz respeito à tomada de medidas conducentes a acabar com os maus tratos que eram alvo os animais usados no transporte de cargas diversas, nomeadamente os que transportavam beterraba para a fábrica do açúcar, à educação dos mais novos através do envio de uma comunicação aos professores “pedindo-lhes para que, mensalmente, façam uma prelecção aos seus alunos, incutindo no espírito dos mesmos a bondade para com os animais, que não é mais do que um coeficiente da bondade universal”e à criação de condições para o seu funcionamento, como foi a aquisição de uma sede e mobiliário.

25 de março de 1914- reunião da direção da SMPA no palácio do Governo Civil com a presença do Marquês de Jácome Correia, presidente da Assembleia Geral, com o chefe do distrito, Dr. João Francisco de Sousa, que deu a conhecer “O projeto do Regulamento Policial, cuja introdução foi da autoria de Alice Moderno, que definirá os direitos dos sócios e os deveres dos agentes da autoridade”.

1 de abril de 1914- Foi inaugurada a sede da SMPA na Rua Pedro Homem nº 15.

5 de novembro de 1914- em reunião de direção da SMPA foi deliberado elevar o Marquês de Jácome Correia, à categoria de sócio protetor, pelo facto de haver concedido à Associação o subsídio anual de cem escudos”.

De 1914 a 1931 - a SMPA passou por um período de inatividade.

7 de julho de 1931- reunião da Comissão Reorganizadora da SMPA composta pelo Dr. Aires Tavares da Silva, Alice Moderno, Gil Afonso Andrade Botelho, Dr. José Jacinto Pereira da Câmara, Dr. Manuel da Silva Carreiro, Maria Evelina de Sousa, Marquês de Jácome Correia e Dr. Victor Machado Faria e Maia com o objetivo de eleger uma nova direção e estudar os meios a usar para intensificar a proteção aos animais. Foi prestada homenagem aos sócios instaladores, em especial a Alice Moderno.

23 de abril de 1933- reuniu, na casa de Alice Moderno, a direção da Sociedade Micaelense Protetora dos Animais para manifestar ao governo a sua oposição aos touros de morte. Foi também decidido solicitar à Junta Geral de Ponta Delgada, a cedência de uma dependência do Posto Zootécnico desta cidade em que pudessem ser alojados o mobiliário da Sociedade e respetivo arquivo, e também do local onde pudesse ser instalado o Posto Zootécnico”.

25 de agosto de 1934 - o Correio dos Açores regista “a justíssima homenagem prestada à sra. D. Alice Moderno” por parte da Direção da Sociedade Protetora dos Animais, de Lisboa, ao conferir-lhe a medalha de prata daquela instituição. Tal facto deveu-se “não só à sua exemplaríssima dedicação pelos animais, mas também pela propaganda jornalística” a favor da causa zoófila.

1941- Segundo o “Correio dos Açores” de 8 de março, com a devida autorização da Junta Geral e a solicitação da SMPA, o Posto Zootécnico de Ponta Delgada, passou a receber todos os animais feridos ou doentes encontrados na via pública que podiam ser entregues a qualquer hora do dia, pois no mesmo pernoitava um guarda.

14 de maio de 1941- o Correio dos Açores, noticia a abertura para breve de um Posto Veterinário que passaria a funcionar no Posto Zootécnico, dirigido pelo Dr. Vitor Machado Faria e Maia. A SMPA colaborou com o referido posto através da oferta de medicamentos e da cedência de algum mobiliário e subsidiava “monetariamente alguns animais abandonados, que tem sido necessário hospitalizar e a que é preciso fornecer alimento, enquanto não se lhes dá destino adequado”.

24 de janeiro de 1945- A direção da SMPA encontrava-se a “reunir fundos suficientes para a construção de um Hospital Veterinário, e das quotas pagas pelos sócios fornecia os medicamentos solicitados pelo Dr. Vitor Faria e Maia para colmatar as necessidades do Posto Veterinário, para além de subsidiar o enfermeiro-veterinário em serviço no Posto,

Agosto de 1945- ter-se-á realizado a última reunião assistida por Alice Moderno, onde foi debatido o problema que preocupou a sociedade desde o início, o peso excessivo da carga que os animais eram obrigados a suportar.

31 de janeiro de 1946- No seu testamento Alice Moderno deixa alguns bens à Junta Geral Autónoma do Distrito de Ponta Delgada com a condição desta, no prazo de dois anos, criar um hospital para animais.

Janeiro de 1948- Começou a funcionar no canto norte da rua coronel Chaves um hospital que mais parecia um canil. O intendente de pecuária, Dr. Vitor Machado de Fraia e Maia não o considerou digno de ser inaugurado.

Mais tarde, em data que não conseguimos apurar, foi construído um Hospital Veterinário na Estação Agrária, em São Gonçalo.

Para além da sua imprescindível contribuição para a SMPA, onde foi presidente de 1914 a 1946 (32 anos), Alice Moderno escreveu sobre a causa animal nos mais diversos órgãos da Comunicação Social, com destaque para o seu jornal “A Folha” (1902-1917), a “Revista Pedagógica” (1906-1916) de Maria Evelina de Sousa e o Correio dos Açores, onde manteve a rubrica “Notas Zoófilas” entre 19 de março de 1939 e 25 de fevereiro de 1944, tendo publicado 42 textos.

Teófilo Braga
7 de outubro de 2022

segunda-feira, 3 de outubro de 2022

QUEM QUER APAGAR O LEGADO DE ALICE MODERNO?

QUEM QUER APAGAR O LEGADO DE ALICE MODERNO?

(Pela reposição da placa existente no antigo Hospital Veterinário Alice Moderno)

Alice Moderno deixou grande parte dos seus bens à Junta Geral na condição de esta no prazo de um ano construir um hospital veterinário.

Apesar de alguns atropelos, o mesmo foi contruído onde hoje se localizam os Serviços de Desenvolvimento Agrário de São Miguel, em Ponta Delgada, e do edifício constava uma placa que recordava a benemérita, amiga dos animais e pioneira da defesa do património natural dos Açores, Alice Moderno.

Durante muitos anos apesar de o edifício já não ter as funções para que foi criado nele funcionou um consultório veterinário que mais recentemente foi substituído por um Centro de Reabilitação de Aves Selvagens.

Com a criação deste centro, os responsáveis entenderam, do nosso ponto de vista mal, retirar a placa inicial, que homenageava Alice Moderno.

Depois de vendido e retirado o seu nome do jazigo que mandou construir no Cemitério de São Joaquim, a retirada da placa no hospital que ostentava o seu nome parece ser um indício da intenção de apagar o nome de Alice Moderno da História dos Açores

O Coletivo Alice Moderno, que pretende dar continuidade aos estudos sobre a vida e a obra de Alice Moderno e Maria Evelina de Sousa, dando-os a conhecer à sociedade através dos diversos meios ao seu dispor, considera que deverá ser reposta a placa no antigo hospital Alice Moderno e homenageando e tendo por base o trabalho por ela já iniciado propõe-se refletir para apresentar propostas no que respeita às mais diversas componentes da vida social, nomeadamente na relação da sociedade com o ambiente e no modo como a mesma trata os animais.

Dia do Animal, 4 de outubro de 2022

Coletivo Alice Moderno

sexta-feira, 9 de setembro de 2022

Alice Moderno, mulher rebelde

Alice Moderno no "Dicionário de Mulheres Rebeldes, de Ana Barradas, editado, em 2006, pela editira Ela por Ela.

sábado, 3 de setembro de 2022

Alice Moderno, a revista “Ou vai…ou racha” e “Ai! Menina Rosa!”


Alice Moderno, a revista “Ou vai…ou racha” e “Ai! Menina Rosa!”

A revista “Ou vai…ou racha”, que fazia apologia da República, estreou- se, em Ponta Delgada, no dia 6 de fevereiro de 1909.

A 14 de fevereiro de 1909, Alice Moderno, através do seu jornal, noticia que o último quadro da revista tinha sido alterado, aparecendo, em vez dos retratos do Diretório do Partido Republicano, o do micaelense republicano e futuro presidente da República Teófilo Braga, que igualmente foi muito saudado.

Depois de nove representações em São Miguel e de mais de 200 em Lisboa a revista foi proibida de voltar à cena em Ponta Delgada porque, de acordo com “A Mocidade” de 24 de março de 1911, “n’ela aparecer a figura de João Franco, esse cons.º em cuja envergadura, que não tinha, um rei confiara, entregando-lhe o ofício de remendão da manta esfacelada e imunda que cobria Portugal inteiro- sob o título fictício de justiça e de paz!”

Durante a manhã do dia 20 de março, em diversos locais de Ponta Delgada os estudantes manifestaram o seu desagrado pela proibição da revista e cantaram a canção “Aí! Menina Rosa!” que fazia parte da mesma.

Ai! Menina Rosa…

Quem será esta dama misteriosa

Que, entre nós, tanto há dado que falar

E a quem dizemos-ai! Menina Rosa

Tenho uma coisa rica p’rate dar?!

Decerto alguma ninfa primorosa

A quem todos pretendem conquistar

E que altiva, repele, desdenhosa

As coisas que nós temos para lhe dar

Ninguém jamais a viu, nem o prazer

Nos concedeu ainda de aparecer

Com a resplandecente imagem sua!

Mas, conservai fechada a vossa porta

E fazer companhia ao João da Horta

Que há tantos meses não sai à rua

Outro Solla-Grossa

Anos mais tarde, segundo Alice Moderno, a Menina Rosa passou a ser a filha do comissário da polícia, Capitão Francisco José Silveira Júnior, responsável pela proibição da revista e por ter dado ordem ao chefe da esquadra para proceder a prisões de estudantes.

No mesmo dia 20 de março, ainda como forma de manifestar o seu desagrado com o ocorrido, os estudantes depois de se concentrarem no Largo da Matriz pelas 20h 30 min foram apresentar cumprimentos ao jornal “Diário dos Açores” e ao jornal “A Folha” de Alice Moderno, cuja redação se situava na Rua do Castilho, mesmo em frente da esquadra da polícia civil.

Pouco depois de terem sido avisados pelo chefe da esquadra de que não queria manifestações e que deviam dispersar, ocorreu a prisão de 11 pessoas, entre as quais a do Dr. Luiz Francisco Bicudo.

A 21 de março de 1909, Alice Moderno, n’ “A Folha” publica várias coplas do primeiro ato da revista. Aqui deixamos três delas, que não perderam de todo atualidade:

Dizem que eu sou pobrezinho,

Que a respeito de baguinho,

Já não tenho nem sinais.

Mas não sei por que razões

Sempre há mais contribuições,

Cada vez eu pago mais.

Pago bródios e festanças,

Pago viagens, pago danças,

Pago toda a trapalhada;

E afinal, p’ra meu agouro,

Pago em prata, pago em ouro,

Dão-me o troco em peixe-espada.

Mas em se acabando a massa,

Quando eu não tiver nem raça,

Perco a bola, fico cego.

E não tendo outros valores,

Deito a mão aos ditadores (1)

Ferro com eles no prego!

(1) A censura prévia mudou esta palavra para cobradores

Alice Moderno esteve associada à revista, quer através da divulgação das apresentações no Teatro Micaelense, quer através do seu contributo com algumas coplas escritas a propósito da festa artística da atriz Maria Dolores que abaixo se transcrevem:

Levarei funda saudade,

Quando me for a embarcar,

Senhoras desta cidade

A quem venho hoje saudar

E em prova do meu respeito

E estima bem manifesta,

Desejei singelo preito,

Sagrar-vos a minha festa

E assim, tendo o aquiescimento

Do vosso riso leal

Vou cantar, com sentimento,

Os fados de Portugal

Não estando presente aquando da visita dos estudantes ao seu jornal, onde foram recebidos pela senhora Maria Emília Borges de Medeiros, Alice Moderno em carta datada de 22 de março agradeceu aos estudantes. Da sua missiva, destacamos o seguinte: “A manifestação de que fui alvo […] vem mais uma vez demonstrar que pode existir entre os que aprendem e os que ensinam perfeita coesão de ideias, desde o momento em que os segundos acompanhem os primeiros nas legitimas e sempre insatisfeitas aspirações do pensamento humano, a cuja evolução progressiva e racional ninguém pôde nem poderá nunca, a não ser muito momentaneamente, pôr entraves”.

Dois anos depois, Alice Moderno não se esqueceu da proibição da revista “Ou vai…ou racha”, tendo recordado que duas ou três prisões de estudantes foram feitas na redação de “A Folha”. Sobre o facto escreveu: “Contra esta violação de domicílio, protestamos em tempo, pelas vias legais e continua erguido bem alto e bem nítido o nosso protesto”.

Nota- atualizei o português de todas as citações

Pico da Pedra, 4 de setembro de 2022
Teófilo José Soares de Braga

quarta-feira, 10 de agosto de 2022

Alice Moderno foi uma “adesiva”?

Alice Moderno foi uma “adesiva”?

Adesivos eram considerados, na Primeira República, todos os que sendo anteriormente monárquicos se converteram oportunisticamente ao novo regime.

O historiador Carlos Cordeiro num texto intitulado “Um percurso político. José Bruno Tavares Carreiro /1880-1957): de Abnegado Regenerador a Autonomista Pragmático” a propósito da nomeação do Dr. José Bruno, após o derrube da monarquia, para secretário-geral do Governo Civil de Ponta Delgada dá a entender que Alice Moderna tal como o homenageado seriam adesivistas. Com efeito segundo ele a referida “nomeação receberia apoio, por exemplo, dos jornais Diário dos Açores, e de A Folha, este dirigido por Alice Moderno, ambos já defensores do novo regime. […] Entretanto, decorriam os preparativos para uma recepção condigna aquando do seu regresso a Ponta Delgada. Alice Moderno — que já dedicara trechos poéticos a Suas Majestades, aquando da «visita régia», e também à implantação da República — escreveu a letra de um hino, composto pelo músico….”

É verdade, e a verdade não pode ser ignorada, que Alice Moderno foi monárquica e que dedicou o seu livro “Açores, Pessoas e Coisas”, publicado em 1901, à Rainha Dona Amélia.

O que não pode ser escamoteado é que Alice Moderno não começou a defender a República apenas após o dia da sua implantação a 5 de outubro de 1910. Bastava para tal ler o seu jornal “A Folha” do ano de 1909 ou então o que escreveu sobre o assunto a Dra. Maria da Conceição Vilhena, no seu livro “Uma Mulher pioneira: Ideias, Intervenção e Acção de Alice Moderno”, publicado, em 2001, pelas Edições Salamandra.

Sobre a questão da adesão de Alice Moderno aos ideais republicanos Conceição Vilhena, na obra referida escreveu o seguinte: “No entanto, com o evoluir da política, a viragem dá-se; e A.M. adere de alma e coração ao partido republicano. Quando, em 1909, a polícia prende onze estudantes que se manifestavam contra a proibição de representar a revista Ou vai …ou racha e por cantarem pelas ruas A Menina Rosa, símbolo da república, A.M. toma abertamente o partido destes, tendo publicado alguns artigos de protesto contra a atitude das autoridades, as quais entraram, na ausência de A.M. na redacção de A Folha, onde os jovens se haviam refugiado.”

Sobre aquele triste episódio que encheu várias páginas dos jornais micaelenses da época, Alice Moderno ao descrever a peça, na edição do seu jornal, “A Folha”, de 7 de fevereiro de 1909, teceu fortes elogios aos republicanos nos seguintes termos:

“No último acto é feita a apoteose do Directorio do partido republicano, o qual é composto, como se sabe, dos homens mais em evidencia pelo seu talento, probidade e dedicação á causa democrática, que é a dos pequenos, dos sofredores, dos eternamente sacrificados- o que bastaria, que mais não fosse, para a tornar sympathica a todos os homens de coração e equidade”.

No mesmo jornal, ainda no tempo da monarquia, Alice Moderno divulgava as iniciativas do Partido Republicano de que é exemplo a notícia, publicada a 9 de maio de 1909, da eleição de Teófilo Braga, futuro presidente da República e amigo de Alice, e de outras personalidades para o diretório daquele partido, num congresso realizado em Setúbal.

Mas, muito antes de 1909 Alice Moderno já havia deixado de estar ao lado dos monárquicos. Com efeito numa carta dirigida a Ana Castro Osório, de 3 de dezembro de 1906, pode-se ler o seguinte: “Então, que me diz ao movimento republicano que se está operando em todo o país? Felicito-o, ou antes, felicitem-nos que eu sou também uma republicana pur sang”.

A desilusão de Alice Moderno com os republicanos e com a política em geral viria mais tarde.

Teófilo Braga
11 de agosto de 2022, nos 155 anos do nascimento de Alice Moderno.

sexta-feira, 1 de agosto de 2014

Coletivos lançam petição anti-tourada na Ribeira Grande


A Assembleia Municipal da Ribeira Grande votou favoravelmente uma recomendação para o não licenciamento de atividades com touros, salvaguardando a segurança das pessoas e animais. Sendo do conhecimento geral que não existem as condições de segurança para a sua realização de práticas tauromáquicas, nem um regulamento municipal que preveja o seu adequado licenciamento nem tampouco entidades municipais competentes para a fiscalização deste tipo de atividades, para surpresa de muitos, a Câmara Municipal da Ribeira Grande entendeu não acolher a recomendação da Assembleia.

Neste sentido, membros do Coletivo Alice Moderno (CAM) e Movimento Cívico Abolicionista da Tauromaquia nos Açores (MCATA) demonstram o seu apoio à recomendação da Assembleia Municipal, lançando uma petição e apelando à subscrição de todas e todos os cidadãos, para que a Câmara Municipal cumpra a deliberação da AM, declarando o concelho livre de espetáculos com touros.

A petição lançada no passado domingo conta já com mais de 300 subscritores.
http://peticaopublica.com/pview.aspx?pi=anti-tourada


PETIÇÃO – Ribeira Grande pelo património natural e cultural, livre de espetáculos com touros

Exmo. Sr. Presidente da Câmara da Ribeira Grande,
Exmos. Srs. Vereadores da Câmara da Ribeira Grande,

Nos últimos anos temos assistido no concelho da Ribeira Grande à promoção e realização de espetáculos de tourada à corda à moda daqueles que são realizados na ilha Terceira. Estas atividades, geralmente anunciadas como “vacadas”, têm sido realizadas sem ter nunca um claro licenciamento e enquadramento legal no município.

Sob esta consideração, a Assembleia Municipal da Ribeira Grande aprovou recentemente uma recomendação à Câmara Municipal “para o não licenciamento de atividades com touros, salvaguardando a segurança das pessoas e animais”. A Assembleia Municipal salienta na sua recomendação que na Ribeira Grande não existe tradição de touradas em nenhuma das suas freguesias, que não existem as condições objectivas nem de segurança para a sua realização, que não existe um regulamento municipal que preveja o seu adequado licenciamento, que não existem funcionários municipais com experiência para as acompanhar e fiscalizar e, finalmente, que “não existe a garantia prévia ou meio de prova que salvaguarde a segurança das pessoas nem a consagração dos princípios de respeito pelos animais e demonstração da utilidade da promoção de atividades deste tipo”. Infelizmente a Câmara Municipal entendeu agora não respeitar esta recomendação.

Nós, cidadãs/ãos, consideramos que práticas de entretenimento com animais como a tauromaquia são uma expressão de insensibilidade e de violência que deseduca e em nada dignifica às pessoas nem o bom nome do concelho.

Achamos incompreensível que estas práticas sejam agora autorizadas na Ribeira Grande, ou mesmo na ilha de São Miguel, onde não existe nenhuma tradição de touradas. Consideramos ainda que a importação à Ribeira Grande destes retrógrados espetáculos, que já foram banidos em muitos países, até naqueles denominados de “países do terceiro mundo”, e são cada vez mais rejeitados em todo o mundo, significa um claro retrocesso civilizacional para o nosso município.

Ainda, salientamos que a realização deste tipo de espetáculos violentos provoca numerosos feridos entre os assistentes, muitas vezes graves, e até mortos, os quais não deveriam pesar nunca na consciência das/os cidadãs/aos ribeiragrandenses, nem dos seus governantes.

Num concelho que quer ser respeitado pela sua modernidade, pelo seu apego e proximidade aos valores naturais, pelo desenvolvimento do turismo de natureza e pelo seu cuidado e bem-estar dos animais, não existe lugar para este tipo de espetáculos degradantes para animais e pessoas.

Assim, através da presente petição, ferramenta de participação cívica, as/os cidadãs/ãos subscritoras/es, apelam à Câmara Municipal da Ribeira Grande que, enquanto poder executivo cumpra a deliberação da Assembleia Municipal de impedir o licenciamento de touradas no nosso município, mantendo o nosso concelho livre de todo tipo de espetáculos com touros;

Pelo Coletivo Alice Moderno e
Movimento Cívico Abolicionista da Tauromaquia nos Açores


quarta-feira, 23 de julho de 2014

Alice Moderno e a ALRA


Alice Moderno e a ALRA

Muito pouco se tem escrito sobre Alice Moderno e quando se escreve, algumas vezes esconde-se partes da sua vida e obra, outras vezes repetem-se falsas informações sem ter o cuidado de ir às fontes primárias ou mesmo ir além das simples pesquisas na internet.

Não sei que fonte ou fontes consultou a ALRA - Assembleia Legislativa Regional dos Açores para elaborar a nota biográfica de Alice Moderno (http://base.alra.pt:82/Doc_Noticias/NI6520.pdf), mas tenho, num caso, muitas dúvidas acerca do rigor de algumas das afirmações e, no outro, tenho a certeza de que se trata de um engano ou erro, espero que não voluntário.

Vejamos a primeira afirmação: “Republicana, depois de 1910, com a implantação da República Portuguesa, passou a participar ativamente na vida social e política de Ponta Delgada, designadamente na campanha a favor da aprovação da lei do divórcio.”

Escrever que Alice Moderno passou a tomar parte na vida social apenas depois de 1910 é ignorar que desde que começou a sua “vida literária”, em 1883, até à implantação da República, a “mulher piorneira” publicou “Aspirações”, “O Dr. Sandoval”, “Os mártires do Amor”, “No Adro”, “Açores: Pessoas e Coisas”, “Os Mártires” e “Mater Dolorosa”. É, também, passar uma esponja sobre a sua atividade jornalística, como fundadora do jornal “Recreio das Salas”, colaboradora ativa do “Diário de Anúncios” e fundadora do jornal “A Folha”.

Tanto quanto é do meu conhecimento, o divórcio foi legalizado em Portugal através de um decreto publicado a 3 de Novembro de 1910, portanto menos de um mês após a implantação da República, pelo que tenho muitas dúvidas acerca da ocorrência de uma campanha realizada entre 5 de Outubro de 1910 e 3 de Novembro do mesmo ano.

Aproveito, a oportunidade, para divulgar o que Alice Moderno escreveu sobre o assunto. No jornal “A Folha” de 16 de Outubro de 1910, pode ler-se:

“Informam telegraficamente que em dezembro próximo será decretada a lei do divórcio. Assim devia ser, e semelhante medida está perfeitamente de acordo com a perfeita orientação do governo provisório da República Portuguesa. O divórcio é permitido em todos os países em evidência pela sua supremacia intelectual, e, muito longe de contribuir para a dissolução da família, é, pelo contrário, um incentivo para a perfeita constituição da mesma”.

A 13 de Novembro, do mesmo ano, na rubrica “URBI ET ORBI”, no mesmo jornal, o assunto do divórcio é referido do seguinte modo:

“ Como noticiáramos no nosso último número, já foi decretada a lei do divórcio…Um telegrama para um nosso colega diário diz ter essa lei dado origem a muitos protestos. Suporão os protestantes que o divórcio é obrigatório, como o serviço militar?!”

A segunda afirmação “Legou os seus bens a diversas causas de beneficência e adquiriu o imóvel das Capelas destinado à Casa do Gaiato”, não faz qualquer sentido como se poderá verificar através da apresentação de alguns dados.

No dia 31 de Janeiro de 1946, Alice Moderno faz um testamento deixando como herdeira proprietária dos seus bens a Junta Geral Autónoma do Distrito de Ponta Delgada, ficando esta obrigada a criar um hospital para animais no prazo de dois anos após a sua morte.

Alice Moderno morre em Fevereiro de 1946 e menos de dois anos depois começou a funcionar um espaço na Rua Coronel Chaves que mais parecia um canil do que um hospital, passando depois para novas instalações que, segundo a prof. Conceição Vilhena, “afirma-se, não tem aquelas dimensões desejadas pela sua fundadora”.

Depois da morte do seu irmão, Vítor Rodrigues Moderno, em 1953, que era o usufrutuário dos bens de Alice Moderno, a Junta Geral, em reunião realizada em 1954, decidiu vender todos os bens e comprar uma casa e propriedade para a instalação da Casa do Gaiato.

Como se poderá concluir Alice Moderno não comprou a Casa do Gaiato, nem deixou em seu testamento nenhuma indicação nesse sentido, tendo a aquisição sido da única responsabilidade da Junta Geral.

Se estiver errado darei a mão à palmatória.


Teófilo Braga
publicado originalmente no Correio dos Açores a 23 de junho de 2014