domingo, 16 de fevereiro de 2025

Alice Moderno e Teófilo Braga

 




Alice Moderno e Teófilo Braga

 

Quem consultar vários documentos existentes na Biblioteca Pública e Arquivo Regional de Ponta Delgada e alguns textos publicados por Alice Moderno em vários jornais facilmente chega à conclusão de que houve uma relação de amizade entre a feminista e defensora dos animais, Alice Moderno, e o escritor e político que foi presidente da República de Portugal, Joaquim Teófilo Fernandes Braga.

 

A troca de correspondência

 

Não podendo, pelo menos por agora, precisar quando começou o relacionamento entre eles, uma coisa é certa, Alice Moderno e Teófilo Braga não se conheceram nos Açores. Com efeito, Teófilo Braga partiu de Ponta Delgada para Portugal continental em 1861 e nunca regressou à sua terra natal e Alice Moderno, nascida em Paris, fixou a sua residência em São Miguel em 1876, embora tivesse passado por Ponta Delgada antes.

 

É bem possível que a iniciativa de contato entre ambos tenha partido de Alice Moderno, através da oferta do seu livro “Aspirações”, publicado em 1886. A carta de agradecimento de Teófilo de Braga pode ser lida no livro “Uma Mulher pioneira-Ideias, Intervenção e Acção de Alice Moderno”.

 

Em 1887, numa carta enviada por Alice Moderno a Teófilo Braga, aquela agradeceu o tempo que este despendeu e agradeceu os conselhos dados, afirmando que os seguirá.

 

Em 1888, Alice Moderno, por carta datada de 20 de agosto, convidou Teófilo Braga para colaborar no seu jornal Recreio das Salas.

 

A 19 de fevereiro de 1890, Teófilo Braga agradeceu dois textos de Alice Moderno sobre o livro, de Camilo Castelo Branco, “A Maior Dor Humana”, onde são homenageados os dois filhos daquele que haviam falecido.

 

Também em 1890, Alice Moderno, que era professora particular em São Miguel, pretendeu ser colocada como professora de Francês num liceu feminino em Lisboa, tendo em carta datada de 16 de abril pedido a Teófilo Braga para indicar o seu nome para ocupar um lugar, visto que os professores eram nomeados e não colocados por concurso. A resposta de Teófilo Braga foi a de que não tinha influência/poder para tal. Na sua carta, datada de 4 de junho, afirmou o seguinte: “Não é por serem governos monárquicos, que eu dignamente estou inibido de pedir qualquer coisa em favor da justiça ou do talento; é porque eu conheço pessoalmente os nossos homens públicos, os nossos grandes estadistas, sei a biografia íntima de cada um, e tendo a todos por entes degradados, organicamente corruptos, enfim como malandros- dando a esta palavra o sentido que o povo lhe imprime quando a aplica aos gatunos mais incorrigíveis.”

 

Teófilo Braga, a 1 de julho de 1893, agradece a oferta do romance de Alice Moderno, “O Doutor Sandoval”, assinando a carta como “muito admirador e servo digníssimo”.

 

Em carta datada de 6 de fevereiro de 1895, Alice Moderno pede a Teófilo Braga para que este use a sua influência no sentido de ser feita justiça num caso de contestação do testamento de Maria Balbina Peixoto, que estava a ser analisado no Supremo Tribunal de Justiça.

 

A 7 de junho de 1901, Teófilo Braga responde a uma carta de Alice Moderno, datada de 20 de maio, “sobre o projecto de uma correspondência para alguns dos jornais mais importantes de Lisboa por ocasião da viagem régia aos Açores.”

 

Nos dias 5 e 19 de outubro de 1915, Alice Moderno envia um cartão a Teófilo Braga cumprimentando-o. Para além deste, na Biblioteca Pública e Arquivo Regional de Ponta Delgada, há outros cartões de Alice Moderno, alguns não datados, de despedida ou de apresentação de pêsames pela morte de familiares de Teófilo Braga.

 

O que havia em comum entre eles?

 

Entre os pontos que tanto Teófilo Braga como Alice Moderno tinham em comum, destacamos o republicanismo e a sua oposição às touradas.

 

Teófilo Braga combateu a monarquia muitos anos antes do seu derrube, em 1910, tendo já em 1878 sido candidato republicano a uma eleições em que obteve 434 votos. Dois anos depois, em 1880, foi candidato republicano pelo Círculo de Ponta Delgada, tendo na altura sido considerado pelo Diário dos Açores como “anarchista” e “atheu” e “defensor da revolução sangrenta”. O vencedor foi Caetano d’Andrade Albuquerque, candidato do Partido Popular Progressista, apoiado pelo referido jornal.

 

Alice Moderno, por sua vez, também aderiu aos ideais republicanos antes da implantação da República. Com efeito, Alice Moderno que primeiro fora monárquica, admiradora dos reis que respeitavam e defendiam a liberdade do povo e que, em 1901, aquando da visita de D. Carlos e de D. Amélia aos Açores, escreveu “Açores, Pessoas e Coisas” que dedicou à Rainha, a 3 de dezembro de 1906, em carta dirigida a Ana de Castro Osório, declara a sua adesão ao movimento republicano, tendo escrito o seguinte: “Felicito-a, ou antes, felicitem-nos que eu sou também uma republicana pur sang”.

 

A posição de Alice Moderno sobre as touradas é a de clara oposição às mesmas e foi manifestada publicamente por mais de uma vez, através dos seus escritos, de que são exemplos as suas Cartas das Ilhas, números XIX e XX.

 

Na “Cartas das Ilhas – XIX”, dedicada a Luís Leitão, publicada no jornal “A Folha”, de 8 de março de 1912, Alice Moderno relata que contrariada foi assistir a uma tourada a convite de amigos terceirenses e confessa a sua compaixão pelo cavalo “esquelético”, um “pobre animal, ser incompleto, irmão nosso inferior” que “no fim da vida, é posto à margem e alugado a preço ínfimo, para ir servir de alvo às pontas de uma fera…”. A fera (o touro) por seu lado, “será barbaramente farpeada, até que, enfurecida, ensanguentada, ludibriada, injuriada, procurará vingar-se arremessando-se sobre o adversário que a desafia e fere”.

 

Na “Cartas das Ilhas – XX”, publicada no jornal “A Folha”, de 10 de março de 1912, Alice Moderno confidencia que, para não ferir suscetibilidades, não fala no “tema perigosíssimo das toiradas”, nem comunica o que vai na sua alma aos terceirenses, que segundo ela são “semi-espanhóis no capítulo de los toros, e não compreenderiam a minha excessiva sentimentalidade”.

 

A posição de Teófilo Braga sobre as touradas é-nos dada a conhecer através de um texto de Vitória Pais Freire de Andrade (1883-1930), uma professora natural de Ponte de Sor que teve um papel de destaque nas organizações e atividades feministas, nomeadamente no Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas, no movimento associativo de professores e no movimento que lutou pela extinção das touradas.

 

Segundo Vitória de Andrade, Teófilo Braga “quando em 1889 foi demolida a célebre praça do Campo de Sant’ Ana, e nesse mesmo ano foi apresentada à Câmara Municipal uma proposta para ela conceder terreno no Campo Pequeno, a fim de ali se fazer uma praça de touros, protestou com toada a sua energia para que tal concessão não se fizesse, atentos os fins desmoralizadores a que se destinava. Como, porém, se encontrava desacompanhado na luta, muito embora defendendo a verdade e a razão, foi vencido…”

 

Após a morte de Teófilo Braga, Alice Moderno escreveu vários textos sobres aquele. Para além do que foi publicado no “In Memoriam do Doutor Teófilo Braga 1843-1924”, intitulado “Um Forte”, destaco o que ela denominou “Teófilo Braga”, publicado num número de homenagem que o Correio dos Açores lhe dedicou e que viu a luz do dia a 24 de fevereiro de 1943.

 

Através do texto “Teófilo Braga” fica-se a saber que numa das suas viagens a Lisboa, Alice Moderno foi convidada por ele, que ocupava o cargo de Presidente da República, para o visitar, como amiga, na sua residência e não no palácio presidencial, onde pouco permanecia, o que aconteceu. O escrito, que vimos citando, termina do seguinte modo:

 

“Açoriano dos mais ilustres, e o mais eminente dos micaelenses, volta a habitar esta ilha, de onde saiu escorraçado pela má sorte, onde regressa, infelizmente em efígie, mas como triunfador.

 

É justo que lhe tributemos as nossas mais vibrantes palmas, e desfolhemos aos pés do seu monumento as nossas mais lindas flores, e justo é também que a Câmara Municipal de Ponta Delgada, seguindo o exemplo da Junta Geral, que comprou aos herdeiros de Teófilo a sua Biblioteca, adquira por sua vez a casa modesta onde nasceu, passando a ser o ninho da águia propriedade concelhia.”

 

 

Bibliografia

 

Braga, T. (2016). O Dr. Teófilo Braga e os animais. Correio dos Açores, 2 de agosto.

Braga, T. (2020). Vidas Exemplares. Ponta Delgada, Letras Lavadas, 327 pp.

Comissão Teófilo Braga (org,) (1934). In Memoriam do Doutor Teófilo Braga 1843-1924. Lisboa, Imprensa Nacional de Lisboa, 518 pp.

Moderno, A. (1943). Teófilo Braga. Correio dos Açores, 24 de fevereiro.

Pereira, J. (1985-1988). A vida em Ponta Delgada em 1880 através do jornal “Diário dos Açores- subsídios para o estudo do século XIX micaelense. In Boletim do Núcleo Cultural da Horta, Vol 8, nº 1-2-3, pp 85- 133.

Vilhena, M. (1987). Alice Moderno- a mulher e a obra. Angra do Heroísmo, Direção Regional dos Assuntos Culturais. 377 pp.

Vilhena, M. (2001). Uma Mulher pioneira-Ideias, Intervenção e Acção de Alice Moderno”. Lisboa, Edições Salamandra. 288 pp.


segunda-feira, 27 de janeiro de 2025

Repúdio pelo uso de dinheiros públicos no apoio a evento sobre a tortura de animais

 







Repúdio pelo uso de dinheiros públicos no apoio a evento sobre a tortura de animais

 

De 24 a 26 de janeiro realiza-se na ilha Terceira (Açores) o Fórum Mundial da Cultura Taurina, onde será debatido o (pouco) futuro da tauromaquia, ou melhor, da tortura de animais, nomeadamente de touros e cavalos.

 

Trata-se de um evento, onde segundo os organizadores estarão presentes representantes de 8 países, uma ínfima minoria, atendendo a que neste momento são reconhecidos pela ONU mais de 190.

 

Num mundo onde cada vez mais são reconhecidos e respeitados os direitos dos animais, alguns cidadãos da ilha Terceira envergonham os Açores ao promoverem um evento onde se promoverá uma prática, a tauromaquia, que já devia estar há muito tempo abolida do mundo civilizado.

 

Para além dos touros e cavalos que são feridos e mortos para divertimento público, só nas touradas à corda na ilha Terceira morreram, em 2024, três pessoas e um número elevado sofreu ferimentos diversos. Além do referido, nos anos de 2018 e 2019 tiveram de recorrer ao Serviço de Urgência do Hospital de Santo Espírito (Terceira) 56 feridos graves.

 

Denunciamos a hipocrisia e repudiamos o apoio dado pelo Governo Regional dos Açores, que se arvora em paladino do bem-estar animal, ao referido evento, atitude que é partilhada pelas Câmaras Municipais de Angra do Heroísmo e da Praia da Vitória.

 

Não ao abuso e à tortura de animais!

 

Não ao uso de dinheiros públicos para apoiar eventos tauromáquicos!

 

Açores, janeiro de 2025

 

Coletivo Alice Moderno

Animal

AVATMA (ASOCIACIÓN DE VETERINARIOS ABOLICIONISTAS DE LA TAUROMAQUIA Y DEL MALTRATO ANIMAL)

Marinhenses Anti Touradas

MCATA- Movimento Cívico Abolicionista da Tauromaquia nos Açores

MATP- Movimento pela Abolição da tauromaquia de Portugal

Associação Ecologista e Zoófila de Aljezur

Rechazo por el uso de dinero público en los apoyos a un foro sobre tortura animal

 

Entre los días 24 y 26 de enero se realizará en la isla Terceira (Azores, Portugal) el Fórum Mundial de la Cultura Taurina, donde será debatido el (escaso) futuro da tauromaquia, o mejor, de la tortura de animales, concretamente de toros y caballos. Se trata de un evento donde, según los organizadores, participarán representantes de ocho países, una ínfima minoría atendiendo a que en este momento la ONU reconoce más de 190.

 

En un mundo donde cada vez más se reconocen y respetan los derechos de los animales, algunos ciudadanos de la isla Terceira avergüenzan a Azores al promover un evento donde se apoyará una práctica, la tauromaquia, que ya debería estar hace mucho tiempo abolida en el mundo civilizado.

 

Más allá de los toros y caballos que resultan heridos y muertos para diversión pública, debe referirse que en la propia isla Terceira murieron tres personas el año pasado en los numerosos festejos realizados con toros ensogados y un número elevado sufrió heridas diversas. De hecho, se sabe ahora que en los años 2018 y 2019 ingresaron en el servicio de urgencias del hospital, por este motivo, un total de 56 heridos graves.

 

Repudiamos así el apoyo dado al referido evento por parte del Gobierno Regional de Azores y denunciamos la hipocresía de éste, al publicitarse a sí mismo como defensor del bien estar animal, en una posición que es compartida por los dos ayuntamientos de la isla, Angra do Heroísmo y Praia da Vitória.

 

¡No al abuso y a la tortura de animales!

 

¡No al uso de dinero público para apoyar eventos tauromáquicos!

 

Azores, enero de 2025.

quinta-feira, 17 de outubro de 2024

PAN recorda Alice Moderno


 Diário dos Açores, 5 de outubro de 2024

sexta-feira, 26 de julho de 2024

Alice Moderno: Fonte de Inspiração

 


Alice Moderno: Fonte de Inspiração

 

Ao longo da sua vida, Alice Moderno (Paris, 11 de agosto de 1867-Ponta Delgada, 20 de fevereiro de 1946), para além de ter trabalhado arduamente para poder viver com independência e dignamente, dedicou muito do seu tempo a lutar por várias causas em que acreditava, com destaque para a igualdade entre homens e mulheres perante a lei e na vida real, as melhores condições de trabalho para todos, a defesa dos animais e um melhor ambiente para todos os seres que vivem na Terra.

 

Se há batalhas que foram vencidas por ela e por todas as mulheres e homens que com ela labutaram ou cujas vitórias só foram alcançadas após o seu falecimento, como o direito ao divórcio ou o direito ao voto, há outras que ainda permanecem e em que se empenham milhares de lutadores, alguns dos quais inspirados no seu pensamento e ação.

 

No que diz respeito à causa animal, houve alguns avanços em relação aos animais de companhia, mas a luta de Alice Moderno contra os espetáculos tauromáquicos continua,  sendo de destacar a vitória alcançada a nível internacional, através da abolição das touradas na Colômbia a partir de 2027.

 

Alice Moderno foi precursora da defesa do ambiente, mais propriamente das árvores e florestas, quer através dos seus escritos, quer, na prática, nas suas propriedades, onde apenas cortava uma árvore depois de morta.

 

Numa altura em que os efeitos das alterações climáticas cada vez se fazem sentir mais e que, segundo Stefano Mancuso, só as plantas “são capazes de repor a concentração de CO2 em níveis inofensivos”, a defesa das florestas é uma batalha que está longe ser ganha, não bastando plantações avulsas sem o cuidado das plantas ao longo dos anos.

 

Julho de 2024

 

Teófilo Braga

terça-feira, 26 de setembro de 2023

Não ao abate de aves nativas nos Açores


Não ao abate de aves nativas nos Açores

Perante os recentes planos do Governo Regional dos Açores de autorizar o abate de aves protegidas, como o pombo-torcaz-dos-Açores (Columba palumbus azorica) e o melro-preto-dos-Açores (Turdus merula azorensis), supostamente por causarem prejuízos à agricultura ou devido a um excesso de população [1], afirmações feitas sem nenhuma base científica ou técnica, queremos denunciar as recorrentes falsidades com as quais se pretende justificar este novo e grave atentado contra a fauna e a natureza das nossas ilhas.

É falso que exista um excesso de população destas aves nativas. Na realidade, todas as espécies nativas têm os seus próprios mecanismos de regulação natural, não fazendo qualquer sentido, na ausência de desequilíbrios induzidos, pensar em excessos de população, e ainda menos num meio de tão reduzidas dimensões como o nosso arquipélago. O conceito de excesso de população só é aplicável, regra geral, às espécies exóticas invasoras, introduzidas pelo homem no arquipélago e, portanto, sem nenhum tipo de regulação natural, como é o caso do coelho-bravo e dos ratos, espécies efectivamente causantes de importantes danos na agricultura.

Pelos mesmos motivos, é uma falsidade dizer, em rigor, que uma ave nativa pode ser considerada uma praga. Não existe, de facto, nenhuma ave nativa nos Açores que possa multiplicar-se de forma rápida e sem controlo criando subitamente uma superpopulação causadora de danos.

Pelo contrário, a situação das espécies nativas é muito preocupante em termos de conservação. O pombo-torcaz-dos-Açores é uma espécie incluída no Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal [2] e a legislação europeia confere-lhe a máxima protecção, proibindo expressamente o seu abate (Directiva Aves, Anexo I), proibição que é igualmente aplicável durante o período reprodutor a qualquer outra espécie protegida.

A população do pombo-torcaz-dos-Açores apresenta-se, na realidade, muito reduzida como consequência da progressiva perda do seu habitat natural, constituído pela floresta laurissilva, quase desaparecida na actualidade, e por causa da caça ilegal [2]. A densidade de população da espécie nos Açores é muito mais baixa do que é habitual para a mesma espécie no continente, contabilizando-se apenas 5 aves/km2 em época pós-reprodutora na maioria das ilhas [3]. Deve considerar-se também que durante a época reprodutora, que vai de fevereiro a setembro, a espécie tem ainda um comportamento territorial [4].

As características da reprodução desta espécie fazem com que uma eventual recuperação das suas populações seja muito difícil, pois de forma geral só têm uma cria por ano. Pior ainda, segundo um recente estudo realizado na Terceira [4], a ilha aparentemente com maior abundância da espécie, o seu sucesso reprodutor é de apenas 9%, chegando a juvenis só uma décima parte do número inicial de ovos. E mais de metade dos indivíduos juvenis poderia não sobreviver ao primeiro ano de vida [3]. Nestas condições, portanto, é irrealista falar de excesso de população ou de que a espécie possa multiplicar-se fora de controlo, sendo certo que o abate de exemplares poderia colocar em grave risco a sobrevivência da mesma.

A verdade é que a desaparição desta espécie é uma possibilidade bem real, como indica o triste exemplo do arquipélago da Madeira: o pombo-torcaz-da-Madeira (Columba palumbus maderensis) foi completamente exterminado em tempos recentes, encontrando-se a espécie actualmente extinta [2]. E a outra espécie de pombo nativo deste arquipélago, o pombo-trocaz (Columba trocaz), continuamente acusado também de causar prejuízos à agricultura, já desapareceu da ilha de Porto Santo, sobrevivendo actualmente apenas na ilha da Madeira.

De facto, pensa-se que há poucas décadas o próprio pombo-torcaz-dos-Açores poderia ter estado próximo da extinção, reduzido talvez a só duas centenas de casais reprodutores, e unicamente foi salvo pela proibição da sua caça na década de 1990 [3]. Curiosamente, mesmo nesses momentos a espécie continuava a ser acusada de causar danos e de estar em excesso. Os estudos existentes revelam, neste sentido, uma incongruência entre as queixas dos agricultores e o comportamento observado nas aves, responsáveis por apenas estragos pontuais e localizados [5].

Na realidade, existe frequentemente uma incorrecta percepção das espécies que são responsáveis pelos danos nas culturas. Apesar de que os viticultores dos Açores têm assinalado muitas vezes estas espécies como pragas, sendo por vezes eliminadas por isso, um recente estudo realizado na ilha Terceira [6] demonstra que o pombo-torcaz-dos-Açores e o melro-preto-dos-Açores provocam danos pouco significativos neste tipo de culturas. Pelo contrário, as principais responsáveis pelas perdas são duas espécies exóticas invasoras: a lagartixa-da-Madeira (Teira dugesii) e o pardal-doméstico (Passer domesticus), para além das várias espécies de ratos, todas elas igualmente invasoras. Resultados semelhantes foram obtidos na ilha do Pico [7].

Outra das aves acusada de ser uma praga, o melro-preto-dos-Açores, é na realidade uma espécie de comportamento territorial, não existindo portanto possibilidade de haver altas densidades de exemplares nem excessos de população. Para além disso, a sua alimentação é omnívora, consumindo ao longo do ano insectos, lagartas, minhocas ou caracóis, pelo que resulta de facto incompreensível esquecer agora o seu possível papel benéfico para a agricultura, próprio deste tipo de aves [6].

Numa situação diferente em relação às anteriores encontra-se a rola-turca (Streptopelia decaocto), uma espécie que tem vindo a colonizar o continente europeu durante o século passado e chegou aos Açores há apenas uns quinze anos, tendo-se reproduzido e expandido desde então pelo arquipélago. Devido à sua recente chegada, pouco é sabido sobre o seu comportamento e a sua possível tendência populacional, ainda que o mais provável é que venha ocupar um habitat semelhante ao do pombo-das-rochas. Refira-se, já agora, o desconhecimento que existe também sobre esta última espécie, considerada cinegética, pois a forma própria das ilhas, o pombo-das-rochas-atlântico (Columba livia atlantis), poderia ter desaparecido devido à introdução e hibridação com as numerosas variedades domésticas da forma continental da espécie.

Apesar de tudo o referido, o Governo Regional decidiu avançar agora, de forma despropositada, com a autorização do abate da rola-turca [8] sem se conhecer a dinâmica da sua população nem quantificar os danos que esta nova espécie nativa possa produzir. A recente autorização contradiz claramente a legislação vigente, pois não são apresentados os imprescindíveis estudos sobre a situação da espécie, não se dá prioridade a métodos de controlo não violentos, não se colocam limites ao abate e não se evita o período reprodutor da espécie. Para além disso, o Governo insiste na falsidade dos danos desta espécie nas culturas vitivinícolas, estigmatizando e relacionando este sector com práticas ambientalmente reprováveis. E longe de tentar clarificar todas estas questões, o Governo Regional ainda evitou propositadamente o debate deste tema na Assembleia Regional [9].

Não há dúvidas de que em toda sociedade moderna qualquer actividade económica, onde a agricultura se insere, deve respeitar limites e regras, não sendo aceitável que essa actividade atente contra as pessoas, a natureza ou o ambiente. Uma agricultura que se quer sustentável e com futuro deve adoptar necessariamente um modelo de actividade integrado e em harmonia com a natureza, mostrando um respeito crescente pelos ecossistemas naturais nos quais se insere.

Surpreende que, ainda hoje, a natureza possa ser considerada como o inimigo e a única solução para qualquer problema seja matar e eliminar as espécies existentes, uma situação própria de tempos passados, quando por exemplo o priolo (Pyrrhula murina), uma ave endémica da ilha de São Miguel, foi considerada nociva e quase exterminada pelos danos que supostamente causava nas culturas de laranja [10]. Mais surpreendente é que o Governo Regional alinhe nesta visão retrógrada e, longe de proteger a fauna nativa e a agricultura, dedique o seu tempo a insistir em falsidades em vez de procurar soluções reais. Existem, de facto, muitas e variadas formas de minimizar os possíveis danos produzidos pelas aves na agricultura: protecções com redes, dispositivos afugentadores de diferentes tipos, plantação simultânea de culturas alternativas, para além das compensações económicas pela eventual perda de rendimentos.

Não é esta, infelizmente, a primeira tentativa de introduzir na região o abate de espécies de aves protegidas. Já em 2015 pretendeu-se autorizar o abate das duas primeiras espécies citadas e do estorninho-dos-Açores (Sturnus vulgaris granti). Finalmente, perante a falta real de argumentos e perante a oposição da opinião pública, o abate foi substituído por medidas reais para minimizar os danos causados na agricultura, preservando-se também, desta forma, a classificação da Paisagem da Cultura da Vinha da Ilha do Pico. Naquele momento, o protesto incluiu uma petição pública [11] que recolheu quase um milhar de assinaturas, contando também com o apoio de diversas organizações ambientalistas regionais e nacionais.

As aves nativas dos Açores, resultado de milhões de anos de evolução, são únicas no mundo, possuem um elevado valor natural e desempenham um papel fundamental na manutenção dos frágeis e ameaçados ecossistemas insulares. É necessário, portanto, adaptar a prática de uma agricultura sustentável à imprescindível protecção das nossas espécies e da natureza das nossas ilhas.

Referências:

[1] Açores vão controlar excesso de aves protegidas que são praga para agricultura. Lusa, 14/08/2023. Acedido em: https://www.sapo.pt/noticias/economia/acores-vao-controlar-excesso-de-aves_64da64e96714d631b617b6ab

[2] Almeida, J., Catry, P., Encarnação, V., Franco, C., Granadeiro, J.P., Lopes, R., Moreira, F., Oliveira, P., Onofre, N., Pacheco, C., Pinto, M., Pitta Groz, M.J., Ramos, J. & Silva, L. 2005. Columba palumbus Pombo-torcaz. Em: M.J. Cabral et al. (eds), Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal, p. 329. Instituto da Conservação da Natureza, Lisboa.

[3] Dickens, M. & Neves, V. 2005. Post-breeding density and habitat preferences of the Azores Woodpigeon, Columba palumbus azorica: an inter-island comparison. Arquipélago. Life and Marine Sciences 22A: 61-69.

[4] Fontaine, R., Neves, V.C., Rodrigues, T.M., Fonseca, A. & Gonçalves, D. 2019. The breeding biology of the endemic Azores Woodpigeon Columba palumbus azorica. Ardea 107: 47–60. doi:10.5253/arde.v107i1.a4

[5] Plano Sectorial para a Rede Natura 2000 – Açores. Espécies da Directiva Aves/Habitats 140/99 Diário da República Anexo A-1: Columba palumbus azorica. IslandLAB. https://islandlab.uac.pt/fotos/publicacoes/publicacoes_Columba_palumbus_azorica_EspeciesDirectivaAvesHabitats140_99_DiarioRepublicaAnexoA-I.pdf

[6] Lamelas-López, L. & Ferrante, M. 2021. Using camera-trapping to assess grape consumption by vertebrate pests in a World Heritage vineyard region. Journal of Pest Science 94:585–590. https://doi.org/10.1007/s10340-020-01267-x

[7] Genética revela que pombo-torcaz é mesmo único nos Açores. Diário Insular, 09/06/2022.

[8] Despacho n.º 1556/2023 de 8 de setembro de 2023. Jornal Oficial II Série - Número 174, 8 de setembro de 2023. https://jo.azores.gov.pt/#/ato/0f622003-4b8b-432c-848f-9cfb8820beec

[9] Partidos de direita ignoram estudo e permitem abate indiscriminado de ave protegida provocando danos na biodiversidade e reputacionais. Nota de imprensa do Grupo Parlamentar do BE. http://base.alra.pt:82/Doc_Noticias/NI18508.pdf

[10] Tavares, J. (coord). 2015. Parecer do Departamento de Biologia sobre o “Projecto de Resolução Nº96-X – Plano estratégico de combate às pragas dos Açores”. Universidade dos Açores. http://base.alra.pt:82/iniciativas/p_social/ps1588.pdf

[11] Petição Pública: Em Defesa da Avifauna Açoriana. Pela conciliação da protecção das espécies com uma exploração agrícola sustentável. http://peticaopublica.com/pview.aspx?pi=DefesaAvifaunaAcores

ASSOCIAÇÕES E GRUPOS ASSINANTES:

Amigos dos Açores – Associação Ecológica

Amigos do Calhau – Associação Ecológica

IRIS – Associação Nacional de Ambiente, Núcleo Regional dos Açores

Avifauna dos Açores

Coletivo Açoriano de Ecologia Social

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2023

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2023

quarta-feira, 21 de dezembro de 2022

Onde residiu Alice Moderno em Ponta Delgada?

Onde residiu Alice Moderno em Ponta Delgada?

Desconhecemos onde morou Alice Moderno quando vivia com os pais em Ponta Delgada. Sabe-se que, em 1883, o pai possuía o consultório na Rua do Colégio, nº 65 (atual rua Carvalho Araújo). Não sabemos se o consultório se localizava no mesmo edifício da moradia.

Foto1- Rua do Colégio, 65 (porta da direita)
Em 1887, quando a família foi viver para a Achada do Nordeste, Alice Moderno fica, em Ponta Delgada, em casa da Dona Rosa Emília de Sequeira Morais, localizada na Rua dos Mercadores, nº 21, 2º andar.

Foto 2- Rua dos Mercadores, nº 19 (o nº 21 não existe atualmente, a porta a meio tem o número 19)

Em princípios de 1893, Alice Moderno já se encontrava a viver no número 69 da Rua dos Mercadores, em casa da senhora Maria Augusta de Morais.

Foto 3- Rua dos Mercadores, 69 (porta à direita)

Ainda no ano de 1893, Alice Moderno começa a viver em casa de D. Maria Emília Borges de Medeiros, na Rua da Fonte Velha, nº 36 (atual Rua Manuel da Ponte). Viveu nesta casa, cujo usufruto vitalício lhe fora legado por aquela senhora, até ao fim da sua vida em 1946.

Foto 4- Rua Manuel da Ponte, 36 (porta ao centro debaixo da placa)

Todas as imagens estarão corretas se não foram, ao longo do tempo, alterados os números de polícia.

Fonte: Vilhena. M. (1987). Alice Moderno: A mulher e a obra. Angra do Heroísmo. Direção Regional dos Assuntos Culturais-Secretaria Regional de Educação e Cultura

Pico da Pedra, 21 de dezembro de 2022

Teófilo Braga

domingo, 4 de dezembro de 2022

Alice Moderno e o Hino das Sociedades Protetoras dos Animais

Alice Moderno e o Hino das Sociedades Protetoras dos Animais

No dia 11 de abril de 1915, Alice Moderno publicou, no seu jornal “A Folha”, o Hino das Sociedades Protetoras dos Animais.

A letra é do jornalista Alberto Bessa (1861-1930) e a música da autoria de Thomaz de Lima (1887-1950). Alberto Bessa foi escritor e jornalista e António Thomaz de Lima foi violinista, compositor, maestro e professor no Conservatório Nacional de Lisboa, tendo residido em São Miguel, onde nasceu o seu filho Eurico Thomaz de Lima, na cidade de Ponta Delgada, em 1908.

Embora, hoje, o entendimento que se tem do “papel” dos animais no mundo seja bastante diferente do que havia no início do século XX, a letra do hino é clara ao afirmar que devemos amar e proteger todos os seres vivos, como se pode concluir através da leitura dos dois últimos versos:

“Sejamos todos bons para tudo o que é vivente:

- Árvore ou animal, insetos ou passarinho.”

Hino das Associações Protetoras dos Animais

Se o homem foi fadado o rei da criação,

E à frente dos mais seres a natureza o pôs,

É seu dever prestar aos outros proteção,

Sem ter jamais direito a ser o seu algoz.

Um povo civilizado

Só é o que souber

A tudo o que é criado

Amar e proteger

No mundo os animais são nossos companheiros,

E embora a natureza os fizesse inferiores,

É certo que lhes deu afetos verdadeiros,

Tornando muitos deles em nossos servidores.

Um povo civilizado

Só é o que souber

A tudo o que é criado

Amar e proteger

Devemos todos, pois, tratá-los com piedade,

Que há uma só justiça, com uma só razão,

Ambas a condenar toda a barbaridade,

Ambas a reclamar para eles compaixão.

Ser bom é uma virtude augusta e resplandecente,

Da qual cumpre seguir o largo e bom caminho,

Sejamos todos bons para tudo o que é vivente:

-Árvores ou animal, inseto ou passarinho.

Pico da Pedra, 4 de dezembro de 2022

Teófilo Braga

sábado, 12 de novembro de 2022

Colocada nova Placa no Hospital Veterinário Alice Moderno

Este mês foi colocada nova placa no antigo Hospital Veterinário Alice Moderno.

terça-feira, 11 de outubro de 2022

Alice Moderno e Maria Evelina de Sousa- Cronologia da sua intervenção em defesa dos Animais

Alice Moderno e Maria Evelina de Sousa- Cronologia da sua intervenção em defesa dos Animais
“Caridade não é apenas a que se exerce de homem para homem: é a que abrange todos os seres da Criação, visto que a sua qualidade de inferiores não lhes tira o direito aos mesmos sentimentos de piedade e de justiça que prodigalizamos aos nossos semelhantes” (Alice Moderno)

26 de novembro de 1908- por iniciativa de Alice Moderno realizou-se uma reunião que também contou com a participação de representantes do Diário dos Açores e de Maria Evelina de Sousa, da Revista Pedagógica. Foi decidido elaborar os estatutos da futura Sociedade Micaelense Protetora dos Animais.

15 de agosto de 1910- João Anglin, no jornal “Vida Nova” publicou um texto a apelar à criação de uma associação de proteção dos animais. Alice Moderno transcreveu o texto no seu jornal “A Folha”.

6 de outubro de 1910- Maria Evelina de Sousa na Revista Pedagógica anuncia que já havia encetado alguns trabalhos, mas havia suspendido por falta de coadjuvação da parte dos restantes membros da comissão que iria criar a associação.

27 de abril de 1911- Maria Evelina de Sousa anuncia a criação em breve da SMPA, cujos estatutos foram redigidos por ela, tendo como modelo os da Sociedade Protectora dos Animais de Lisboa. “O Sr. Henrique Xavier de Sousa, que é um calígrafo muito hábil” ficou incumbido “de os copiar em conformidade com a lei”.

13 de setembro de 1911- Foi legalizada a SMPA. Foram seus fundadores: Caetano Moniz de Vasconcelos (governador civil), Alfredo da Câmara (diretor de O Repórter), Amâncio Rocha, Augusto da Silva Moreira, Fernando de Alcântara, Francisco Soares Silva (director do jornal anarquista Vida Nova), José Inácio de Sousa, Joviano Lopes, Manuel Botelho de Sousa, Manuel Resende Carreiro, Marquês de Jácome Correia, Miguel de Sousa Alvim, Alice Moderno e Maria Evelina de Sousa.

14 de novembro de 1912 - a Revista Pedagógica publicou um texto onde o seu autor dá a conhecer que a SMPA já estava a cobrar as quotas dos seus associados e que a sede da mesma continuava a ser nas instalações dos Bombeiros Voluntários de Ponta Delgada até à sua passagem para a rua da Fonte Velha (casa de Alice Moderno?).

28 de novembro de 1912- Em reunião da SMPA foi decidido oficiar à Câmara Municipal de Ponta Delgada “a regulamentação das carroças puxadas por carneiros” e “oficiar à corporação competente para que seja modificada a rampa no início da rua dos Mercadores, rampa que é um verdadeiro tormento para os pobres animais”.

29 de junho de 1913- noticia que, após diligências efetuadas pela SMPA, a Câmara Municipal de Ponta Delgada decidiu criar “uma nova postura proibindo que carneiros e animais congéneres sejam considerados como de tiro”.

1914- Alice Moderno é eleita presidente e sob a sua presidência a vida da SMPA alterou-se por completo, tanto no que diz respeito à tomada de medidas conducentes a acabar com os maus tratos que eram alvo os animais usados no transporte de cargas diversas, nomeadamente os que transportavam beterraba para a fábrica do açúcar, à educação dos mais novos através do envio de uma comunicação aos professores “pedindo-lhes para que, mensalmente, façam uma prelecção aos seus alunos, incutindo no espírito dos mesmos a bondade para com os animais, que não é mais do que um coeficiente da bondade universal”e à criação de condições para o seu funcionamento, como foi a aquisição de uma sede e mobiliário.

25 de março de 1914- reunião da direção da SMPA no palácio do Governo Civil com a presença do Marquês de Jácome Correia, presidente da Assembleia Geral, com o chefe do distrito, Dr. João Francisco de Sousa, que deu a conhecer “O projeto do Regulamento Policial, cuja introdução foi da autoria de Alice Moderno, que definirá os direitos dos sócios e os deveres dos agentes da autoridade”.

1 de abril de 1914- Foi inaugurada a sede da SMPA na Rua Pedro Homem nº 15.

5 de novembro de 1914- em reunião de direção da SMPA foi deliberado elevar o Marquês de Jácome Correia, à categoria de sócio protetor, pelo facto de haver concedido à Associação o subsídio anual de cem escudos”.

De 1914 a 1931 - a SMPA passou por um período de inatividade.

7 de julho de 1931- reunião da Comissão Reorganizadora da SMPA composta pelo Dr. Aires Tavares da Silva, Alice Moderno, Gil Afonso Andrade Botelho, Dr. José Jacinto Pereira da Câmara, Dr. Manuel da Silva Carreiro, Maria Evelina de Sousa, Marquês de Jácome Correia e Dr. Victor Machado Faria e Maia com o objetivo de eleger uma nova direção e estudar os meios a usar para intensificar a proteção aos animais. Foi prestada homenagem aos sócios instaladores, em especial a Alice Moderno.

23 de abril de 1933- reuniu, na casa de Alice Moderno, a direção da Sociedade Micaelense Protetora dos Animais para manifestar ao governo a sua oposição aos touros de morte. Foi também decidido solicitar à Junta Geral de Ponta Delgada, a cedência de uma dependência do Posto Zootécnico desta cidade em que pudessem ser alojados o mobiliário da Sociedade e respetivo arquivo, e também do local onde pudesse ser instalado o Posto Zootécnico”.

25 de agosto de 1934 - o Correio dos Açores regista “a justíssima homenagem prestada à sra. D. Alice Moderno” por parte da Direção da Sociedade Protetora dos Animais, de Lisboa, ao conferir-lhe a medalha de prata daquela instituição. Tal facto deveu-se “não só à sua exemplaríssima dedicação pelos animais, mas também pela propaganda jornalística” a favor da causa zoófila.

1941- Segundo o “Correio dos Açores” de 8 de março, com a devida autorização da Junta Geral e a solicitação da SMPA, o Posto Zootécnico de Ponta Delgada, passou a receber todos os animais feridos ou doentes encontrados na via pública que podiam ser entregues a qualquer hora do dia, pois no mesmo pernoitava um guarda.

14 de maio de 1941- o Correio dos Açores, noticia a abertura para breve de um Posto Veterinário que passaria a funcionar no Posto Zootécnico, dirigido pelo Dr. Vitor Machado Faria e Maia. A SMPA colaborou com o referido posto através da oferta de medicamentos e da cedência de algum mobiliário e subsidiava “monetariamente alguns animais abandonados, que tem sido necessário hospitalizar e a que é preciso fornecer alimento, enquanto não se lhes dá destino adequado”.

24 de janeiro de 1945- A direção da SMPA encontrava-se a “reunir fundos suficientes para a construção de um Hospital Veterinário, e das quotas pagas pelos sócios fornecia os medicamentos solicitados pelo Dr. Vitor Faria e Maia para colmatar as necessidades do Posto Veterinário, para além de subsidiar o enfermeiro-veterinário em serviço no Posto,

Agosto de 1945- ter-se-á realizado a última reunião assistida por Alice Moderno, onde foi debatido o problema que preocupou a sociedade desde o início, o peso excessivo da carga que os animais eram obrigados a suportar.

31 de janeiro de 1946- No seu testamento Alice Moderno deixa alguns bens à Junta Geral Autónoma do Distrito de Ponta Delgada com a condição desta, no prazo de dois anos, criar um hospital para animais.

Janeiro de 1948- Começou a funcionar no canto norte da rua coronel Chaves um hospital que mais parecia um canil. O intendente de pecuária, Dr. Vitor Machado de Fraia e Maia não o considerou digno de ser inaugurado.

Mais tarde, em data que não conseguimos apurar, foi construído um Hospital Veterinário na Estação Agrária, em São Gonçalo.

Para além da sua imprescindível contribuição para a SMPA, onde foi presidente de 1914 a 1946 (32 anos), Alice Moderno escreveu sobre a causa animal nos mais diversos órgãos da Comunicação Social, com destaque para o seu jornal “A Folha” (1902-1917), a “Revista Pedagógica” (1906-1916) de Maria Evelina de Sousa e o Correio dos Açores, onde manteve a rubrica “Notas Zoófilas” entre 19 de março de 1939 e 25 de fevereiro de 1944, tendo publicado 42 textos.

Teófilo Braga
7 de outubro de 2022

segunda-feira, 3 de outubro de 2022

QUEM QUER APAGAR O LEGADO DE ALICE MODERNO?

QUEM QUER APAGAR O LEGADO DE ALICE MODERNO?

(Pela reposição da placa existente no antigo Hospital Veterinário Alice Moderno)

Alice Moderno deixou grande parte dos seus bens à Junta Geral na condição de esta no prazo de um ano construir um hospital veterinário.

Apesar de alguns atropelos, o mesmo foi contruído onde hoje se localizam os Serviços de Desenvolvimento Agrário de São Miguel, em Ponta Delgada, e do edifício constava uma placa que recordava a benemérita, amiga dos animais e pioneira da defesa do património natural dos Açores, Alice Moderno.

Durante muitos anos apesar de o edifício já não ter as funções para que foi criado nele funcionou um consultório veterinário que mais recentemente foi substituído por um Centro de Reabilitação de Aves Selvagens.

Com a criação deste centro, os responsáveis entenderam, do nosso ponto de vista mal, retirar a placa inicial, que homenageava Alice Moderno.

Depois de vendido e retirado o seu nome do jazigo que mandou construir no Cemitério de São Joaquim, a retirada da placa no hospital que ostentava o seu nome parece ser um indício da intenção de apagar o nome de Alice Moderno da História dos Açores

O Coletivo Alice Moderno, que pretende dar continuidade aos estudos sobre a vida e a obra de Alice Moderno e Maria Evelina de Sousa, dando-os a conhecer à sociedade através dos diversos meios ao seu dispor, considera que deverá ser reposta a placa no antigo hospital Alice Moderno e homenageando e tendo por base o trabalho por ela já iniciado propõe-se refletir para apresentar propostas no que respeita às mais diversas componentes da vida social, nomeadamente na relação da sociedade com o ambiente e no modo como a mesma trata os animais.

Dia do Animal, 4 de outubro de 2022

Coletivo Alice Moderno

sexta-feira, 9 de setembro de 2022

Alice Moderno, mulher rebelde

Alice Moderno no "Dicionário de Mulheres Rebeldes, de Ana Barradas, editado, em 2006, pela editira Ela por Ela.